terça-feira, 4 de agosto de 2015

À Conversa com Paulo Santos autor de A Linha do Tempo

Paulo Santos

Nasceu em Angola, Luanda, no ano de 1966. Está em Portugal desde 1974 e vive no concelho de Mafra desde 2005. 
É licenciado em Psicologia e Mestre em Educação de Adultos.



O Marcas de Leitura esteve à conversa com Paulo Santos autor de "A Linha do Tempo".
Obrigada pelas simpáticas e gentis palavras com que nos brindou e pelo tempo que nos dispensou.





1) Fale-nos um pouco sobre si. Quem é o Paulo?
É sempre difícil falar de mim, quando posso sinalizar centenas ou milhares de pessoas que, de uma maneira geral, se identificam comigo. Em todo o caso posso dizer que resulto de uma união de 2 pessoas de 2 continentes. Parte das minhas origens está em Lisboa, a outra em Angola, onde nasci. A fuga da zona de guerra trouxe-me para a capital portuguesa, de onde saí há 2 décadas, quando casei. Estou há dez anos neste belo concelho de Mafra.
Em termos profissionais, sou licenciado em Psicologia, Mestre em Educação de Adultos.
Pessoalmente, para além do gosto pela escrita e leitura, gosto da natureza em geral, como podem ver pelas imagens disponíveis na página
https://www.facebook.com/Alinhadotempo.
Devem estar a pensar: “mas para um psicólogo, onde andam … as pessoas?”. Bom, essa é a parte que fica reservada. Gosto de estar na vida de forma discreta mas intensa.

2) Como começou a sua paixão pelos livros e o gosto pela escrita?
Curiosamente, perto de terminar o ensino secundário. Aos 16 anos, em conjunto com uns colegas, fiz uma peça de teatro sobre o julgamento de Sócrates e que se assumia como um desafio lançado pela Professora da disciplina de Filosofia, mas que acabou na gaveta (na altura não havia computadores!). Fui escrevendo textos soltos e versos, mas nunca lhes atribuí grande importância. A paixão foi consolidada, pois, quando ler e escrever deixou de ser uma obrigação escolar, o que me leva a refletir se de facto o nosso ensino não deveria conquistar leitores e escritores, antes de os direcionar para obras consideradas de referência da nossa literatura.

3) Faz da escrita a sua profissão ou não? Não. 
Gosto de ter a escrita como uma … “amante” da minha profissão, onde ocupo os espaços e tempos que aquela deixa por preencher, depois de retirados os dedicados à família, amigos e ações sociais. Em todo o caso, e muito honestamente, não me vejo a escrever, fazendo disso uma profissão. O que gosto na escrita é a liberdade que ela me concede e o prazer que me dá. Podendo fazê-lo, só o faço quando me sinto inspirado e não me parece que possa aplicar este princípio num contexto profissional. Sou um “intruso” dos meios literários que nem seguiu a área de letras.

4) De onde surgem os seus personagens, imaginação ou realidade? 
Para se ter uma ideia de como surgem e a título de exemplo, direi que posso ir às compras na feira da Malveira, ao fim-de-semana e não me lembrar de trazer todos os sacos onde coloquei as frutas e legumes. No entanto, se alguma frase, postura ou episódio se me deparar que me transporte ao que estou de momento a escrever, isso fica registado! Gosto de andar livremente entre pessoas que conheço ou não, em vários locais e contextos e a utilização de transportes públicos ajuda muito a criar as minhas personagens. Estas surgem de uma combinação do que conheço e do que imagino, mas também das minhas vivências.

5) A Linha do Tempo é o seu primeiro livro, ou tem outros editados? 
A linha do tempo é o meu primeiro romance publicado, embora quando vim morar para o concelho de Mafra, o gosto pela leitura estava há muito enraizado e nessa altura senti necessidade de conhecer um pouco mais sobre a localidade. Fiz então um levantamento histórico da freguesia Venda do Pinheiro, depois de ter feito o mesmo no que concerne ao Clube Desportivo da Venda do Pinheiro.

6) Como e onde surgiu a história e o título de A Linha do Tempo?
 Um dia, comecei a escrever “A linha do tempo” e só parei seis meses depois, quando concluí a obra. Basicamente foi assim, correspondendo a um período de menor exigência a nível cognitivo. Gosto de ter sempre várias coisas para fazer (em simultâneo) e assim comecei a juntar palavras, frases, parágrafos e aos poucos a história foi-se compondo. A princípio a intensão era tão-somente ocupar o tempo e a mente e não pensava em escrever um livro. Escrevia nos transportes, quando estava à espera de alguém, às vezes surgia-me uma ideia a meio da noite tão que forte que acordava e a registava, enfim, a escrita invadiu-me. Um dia percebi que a história estava já em mente e a partir desse momento, fui passando as ideias para o papel. O título surgiu numa fase inicial, embora existissem outras opções próximas daquela por que adotei.

7)Tem algum personagem favorito no livro? 
Geralmente gosto mais dos personagens secundários e/ou que fazem o trabalho de bastidores, tão fundamental quanto muitas vezes desconhecido. Neste caso, Vanda, a mulher do personagem principal, é a trave-mestra e por isso é a que mais aprecio.

8) Quando está a escrever um livro partilha a história com alguém para se aconselhar? 
Sim, para além da minha mulher, tenho duas colegas de trabalho que são as minhas primeiras críticas e conselheiras. Assim foi em A linha do tempo e também assim está a ser no meu segundo romance, já concluído e em fase de apreciação.

9) Quando terminou de escrever o livro, qual a sensação? 
Como já estava pensado há muito, senti uma certa nostalgia. Apetecia-me continuar a escrever, pois cria-se uma relação com a obra e é difícil convencermo-nos que aquela terminou. Felizmente que logo outra história se começou a formar e foi então possível entregar A linha do tempo aos leitores, para que dissessem de sua justiça.

10) Qual o seu autor e livro preferido? Segue o género literário do seu autor preferido, ou adopta outro? 
Eu leio continuamente (às vezes mais que um livro no mesmo período temporal) e procuro sempre alargar o conhecimento de autores e géneros literários. Desta forma, posso referir alguns dos nossos escritores, como “A capital” do Eça de Queirós, passando por “As esquinas do tempo”, da Rosa Lobato Faria. Por esse mundo fora, não faltam obras-primas, desde “Os Capitães da Areia” do Jorge Amado, até “Diz-me Quem Sou” da Júlia Navarro. Em relação ao género literário, não me atrevo, por assim dizer, em tentar adotar o género literário de nenhum dos mestres que referi, mas fico surpreendido e quase preocupado (embora feliz!), quando me dizem que há algo de Eça nas linhas de A linha do tempo. Acho que a escrita deve espelhar de forma genuína o que queremos dar a conhecer aos outros. Como em qualquer arte, é possível aferir se uma obra tem ou não qualidade, mas já quanto ao gosto pessoal, este é muito subjetivo e ainda bem que assim é. Costumo dar como exemplo o nosso Prémio Nobel, José Saramago, que muitos veneram e com que outros não se identificam de todo. Para mim, enquanto leitor, o importante é haver quantidade, qualidade e diversidade e isso depende de quem escreve e decide partilhar, naturalmente.

11) Qual a sensação, ao deslocar-se a uma superfície comercial, e ver os seus livros à venda? 
Infelizmente, ainda não experimentei essa sensação. A Chiado Editora, que decidiu apostar na obra de um desconhecido dos meios literários, como é o meu caso, entre outros tantos, tem geralmente os livros disponíveis na sua Livraria Desassossego, na Rua de São Bento, nº 34 em Lisboa (cuja visita recomendo!) e on-line, na Bertrand e Wook. Sei por experiência própria que essa é uma desvantagem e por isso tento realizar sessões de apresentação, sempre que se proporciona. Quando tal acontece, há sempre uma componente solidária associada. Tem sido uma experiência fascinante.

12) Já alguma vez se deparou com alguém a ler um livro seu? Se sim, como se sentiu? 
Sim, embora se tratasse de alguém meu conhecido. No entanto, a ansiedade e curiosidade estão lá e poderão ser ampliadas, se me deparar com alguém que não conheça e que esteja a ler o livro. Em bom rigor, não posso deixar de dizer que o livro contém, para grande incómodo meu, algumas “gralhas” que passaram “invisíveis” a quem o leu antes da sua publicação. Há quem dê por elas, para outros passa despercebido, mas a explicação que me dão, ou seja, que se deixaram envolver pela história e não repararam, deixa-me sem argumentos. Em todo o caso, é algo que assumo total e pessoalmente e que neste momento está ultrapassado, embora só se vá refletir numa eventual próxima edição. Tudo isto é fruto da aprendizagem e da inexperiência nestas lides.

13) Como vê o momento actual da Literatura em Portugal? 
Uma análise ao momento atual da Literatura no nosso país, implica focar vários aspetos. Começa desde logo com o acordo ortográfico (ou desacordo!) que tanta “tinta” faz correr e que desvia recursos e tempo em torno da questão. Urge envolver todas as partes e chegar a um consenso o mais alargado possível. Depois temos uma diferença clara entre quem tem forma de utilizar os grandes meios de divulgação para dar a conhecer os seus trabalhos (como acontece com certas figuras públicas) e os outros, que muitas vezes se socorrem de amigos, de familiares e das redes sociais para uma divulgação que é mais circunscrita. Para termos uma ideia do que chega diariamente ao mercado nacional, só a Chiado Editora publica uma média de quase 2 livros por dia, isto para um país com 10 milhões de habitantes, onde de acordo com um estudo recente realizado na Universidade do Minho, 10% dos alunos do secundário nunca leu um livro até ao fim e 14% das famílias dos participantes no inquérito não têm livros em casa. Se entrarmos num espaço público, é muito possível que uma grande parte das pessoas esteja a ler, confirmando assim que, primeiro o sabem fazer e depois que esse é um meio importante para comunicar. No entanto, é provável que muitas dessas pessoas procure informação no telemóvel ou no Tablet, ou mesmo esteja a folhear um jornal. A ler um livro, estará eventualmente uma minoria, mesmo se o podem fazer digitalmente. Eu diria que atualmente existe um mercado plural, em expansão, mas que ainda deixa a desejar em termos de democratização da divulgação. A aposta em novos escritores deve ser acompanhada de um conjunto de iniciativas, locais, regionais, nacionais ou setoriais, junto dos públicos-alvo a que se destinam as obras. Mas o grande desafio continua a ser colocar as pessoas na rota da leitura de livros, com interesse e prazer.

14) Como vê a divulgação dos bloggers literários? 
Constituem-se como uma excelente forma de equilibrar a relação entre quem já é conhecido no mercado e quem está a dar os primeiros passos, para além de dar a conhecer obras e seus autores. A sua dinâmica e permanente atualização, bem como o acesso direto, sem registos, publicidade que se sobrepõe e alertas vários, fazem destes espaços uma mais-valia.

15) Quer deixar alguma mensagem especial aos seguidores do blog Marcas de Leitura?
Creio que o mais importante passa por garantir que o blog não se feche sobre si próprio, melhor dizendo, sobre quem os gere e alimenta, sendo que a melhor forma de o fazer é partilhar a sua existência com outras pessoas.
  
Para já fico-me por aqui e agradeço desde já a sua disponibilidade e simpatia, foi um prazer.


Muito obrigada Paulo desejo-lhe as maiores felicidades e sucessos!

A Linha do Tempo



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